29.5.09
Isto pega-se.
Disse-lhe que fosse para Farmácia. E que arranjasse um namorado rico com quem casar. Formou-se em 2007, mas sem dar ouvidos ao pai. As meninas cá de casa são assim, a mais nova já vai pelo mesmo caminho. Depois de ter o canudo na mão foi viajar pela Europa. Voltou e meteu mãos à obra fazendo o que gostava, a hora era bem paga mas o trabalho só chegava de vez em quando. Pegou nas ecomomias e, ano passado, abalou para o Oriente. China, Macau e Bali, claro, onde as ondas são as melhores e o surf mais exigente e prazeiroso. De regresso a Lisboa, entre esse trabalho que só chega de vez em quando, tratou de conseguir uma bolsa de estudo e partiu para Barcelona. Lá deixou-se encantar e foi seduzida. Pela cidade, que namorado rico nem vê-lo. Cansa só de ler, não cansa? É o que eu lhe digo, mas não me dá ouvidos, a moça. Voltou em Janeiro e esta semana arremessou-me, convicta, que quer ir para a Austrália. Muito bem, vamos conversar, disse-lhe eu. Afinal já se tinha informado sobre tudo, ia (já foi) a uma entrevista na embaixada e agora empenhou-se em arranjar o dinheiro suficiente para partir, com bilhete de ida, apenas. A meio da conversa, as palavras dela despenharam-se sobre mim como um comboio de que não temos tempo de nos desviarmos. Pai, eu olho para ti e vejo-te a trabalhar doze horas por dia para nos sustentares, vivermos com conforto e pagares contas. E olho para este país e não consigo ver no horizonte uma perspectiva risonha. Ainda se trabalhasses tanto e pudesses ter a sensação de estares a construir um país melhor daqui por quinze anos, era diferente. Não quero sentir isso quando chegar à tua idade, percebes? Percebo, claro que percebo. E agora? Que raio de sentimento este que tenho de que isto pega-se.
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19 comentários:
Pois, pois, aposto que cresceu ouvindo o pai a dizer que quer emigrar. Ainda bem que não foi na conversa dos frangos :)
Glup: trabalhar para pagar despesas... pois! Percebo-a.
(e é uma sorte, que há quem não tenha trabalho ou, tendo-o, que chegue para as despesas)
Isto tem que se lhe diga, Cristina. Nem sabe o tormento que passei para fazer um texto tão resumido. É que se trata de um assunto que dava pano para mangas. Esta menina desde os 16 anos que vive com o pai, e o ADN e a convivência parecem mãos incansáveis a moldar o barro mais rebelde. Tem razão: ainda bem que ela não vai em frangalhada. :D
Fugidia, :)
Ela sabe dessa sorte. E quando se esquece, eu encarrego-me de lhe relembrar. ;D
Deixa-a voar! Sempre que o fizer homenageia quem lhe deu as asas.
Decisões difíceis, Mike, decisões mesmo muito difíceis.
Com este seu post, hoje não sou capaz de brincar, porque me revejo nele, na dificuldade que temos em deixar os filhos tomar o seu próprio rumo. A razão puxa para um lado, o coração para outro, a experiência pesa e confunde ainda mais.
E por mais determinados e seguros daquilo que fazemos, nunca temos a garantia de que o estamos a fazer acertadamente.
Bem diz o povo, que só aprendemos a ser filhos, quando somos pais...
Pois... a Pitucha fala assim porque não é sua... (muitos risos)
Sim, deixarei que ela voe, Pitucha, como sempre fiz. :)
(Bem aparecida seja).
Gostei de ler o seu comentário, Si. Mas sabe?, farei o que disse no comentário acima. Ela que voe e que esse vôo a torne feliz. :)
Mike, ou muito me engano ou essa vontade de voar é também seu fruto. É claro que deve ser difícil mas, tal como diz a Pitucha, tenho a certeza que a sua filha o homenageará sempre. Quanto ao facto de ela(s) não o ouvir(em), os pais servem para isso mesmo, para parecer que não os ouvimos, mas ouvimos :-)
Eu, ainda um pouco iludida, ainda acho que vou mudar isto tudo...lol
beijinho
Acho que não se engana, Leonor. :)
Crê mesmo que os filhos ouvem os pais? Hum... dá-me jeito acreditar. ;D
Crer é poder, Lady Bird. Acredite e vai ver que muda isto tudo mesmo. ;)
Compreendo bem o desalento da sua filha, Mike, que é o desalento geral. Mas hoje quase subscrevo a atitude muito positiva da nossa Lady-Bird. Não porque ache que consigo mudar alguma coisa, mas porque:
1. Acho que a mudança é uma inevitabilidade e que, porque batemos no fundo, essa mudança só poderá ser para melhor (falo em termos de mentalidade, não ainda de situação económico-financeira);
2. Acho que sentiria o mesmo desalento nos outros países que cultural, climatérica e paisagisticamente me atraem, como, por exemplo, a Itália.
3. Sonho, enfim, com uma emigração para a Noruega porque talvez só aí não encontrasse motivos de desalento… Mas sei que o sistema do dia e da noite semestrais acabaria por me inquietar os nervos. ;-D
Sempre lúcidos e cristalinos, os seus comentários, Luísa. Gostaria, contudo, de acrescentar uma ou outra coisa que os seus dizeres me deixaram a pensar. A primeira é que a percepção e consciência geral do "bater no fundo" não é real, o que é preocupante. A segunda é que não deixaríamos (eu, a Si, a GJ e a Fugidia, sim, que Elas falam mas acabariam por se manter na sociedade), dizia eu que não deixaríamos que a inquietação se apoderasse de si. Nem que tivesse que ter um estatuto especial e gozar férias "semestrais". :D
É bem a tua filha, Mike. Deixa-a ir, que este país não lhes promete nada de novo.
Houve qualquer coisa que me escapou no raciocínio da moça.
Não quer ter a sensação de não contribuir para um país melhor daqui a 15 anos, e por isso vai para outro? Explica-me lá isso, se quiseres.
Ana, e achas que há alguma coisa que eu possa fazer para a convencer a ficar se o desejo dela for partir? ;)
Ó L., creio que o raciocínio, mesmo sabendo onde queres chegar, é procurar um país (outro) onde sinta que a contribuição do seu trabalho e esforço tenha consequências positivas no futuro. E aí, meu caro, deixa-me assim a modos que de mãos atadas.
Um dia destes passei à porta da referida embaixada, na Avenida da Liberdade, e deu-me uma vontade doida de entrar e pedir asilo. Porquê? Talvez porque a Nova Zelândia não mantém embaixada cá... acho que a mais próxima é em Roma.
José, a minha mais velha já me informou sobre tudo. Nem sequer há restrições sobre idade ou profissão. Mais dificuldade sim, mas restrições não.
Mike, eu não quero que fique demasiado peneirento, mas decidi publicar o meu texto depois de ler este aqui. Por isso, ainda bem que se sentiu mãe por uns instantes.
Acredito que se sinta muitas vezes.;)
E é verdade o que diz. Quando eles começam a voar nós sentimos que chegou a nossa vez de procurarmos outras paragens. Afinal, o ninho está vazio!
Shiiuuu, GJ... não diga a ninguém, mas gostei mais de ler o seu texto. ;D
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