30.10.08

Amigo

Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavra “amigo”.

“Amigo” é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!

“Amigo” (recordam-se, vocês aí,
Escrupulosos detritos?)
“Amigo” é o contrário de inimigo!
“Amigo” é o erro corrigido,

Não o erro perseguido, explorado,
É a verdade partilhada, praticada.

“Amigo” é a solidão derrotada!

“Amigo” é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
“Amigo” vai ser, é já uma grande festa!

Alexandre O’Neill, in No Reino da Dinamarca

Deu-me uma vontade de voltar ao grande O’Neill, que estou a reler. Às vezes dá-me para isto, o que é que querem que vos diga? Mas não dispenso o Calvin e o seu amigo Hobbes na mesa de cabeceira.

29.10.08

Meus companheiros inseparáveis (I)


O segredo de Domingo.

“O Domingo é, para quase todos nós, mais do que um dia de semana, um estado de espírito; e um estado que é de espera e triste resignação, que se vai carregando à medida que as horas passam, a luz quebra e o tempo livre cede lugar ao tempo marcado, contado, destinado a perder-se, sem memória, no fluir da vida”. Ao manifestar o meu défice de afinidade em relação a este parágrafo que dá início a um belíssimo texto, fui questionado sobre qual seria o meu segredo para que os meus domingos fossem quase sempre uma animação e convidado a partilhá-lo. O segredos não se contam a ninguém, bem sei, mas este é um caso para se abrir uma excepção. É simples, muito simples! Tão simples como roubar um chupa-chupa a uma criança, desde que não seja o meu mais novo, claro. E aqui está a primeira parte do segredo. Ser pai tardio, daqueles que, aos quase 50 anos, ainda têm que ensinar os filhos a andar de bicicleta, ou mudar os lençóis a meio da noite porque o rapazito largou as fraldas nocturnas, mas ainda há noites em que se “distrai”. Ou brincar ao Lego às seis da tarde, ou muitas outras coisas mais. Adiante. Ser pai tardio e divorciado, o que faz com que as tarefas não conheçam as contas de dividir e subtrair, apenas as de multiplicar e somar. Mas sendo pai divorciado, há fins-de-semana em que as contas são outras. Pois há. Mas são as contas que ajustamos com as ondas do mar. Sejam quais forem os Domingos, eles são uma canseira que, ao fim ao cabo, se torna numa animação. Num estado de espírito oposto ao estado de espera e triste resignação, nunca se carregando à medida que as horas passam. É este o segredo. Em resumo: basta ser-se pai fora de tempo e divorciado, e gostar-se de mar e de bodyboard. Bem, não ser rico também ajuda.

28.10.08

Estou a precisar de férias. De descansar.

Um post de m...

Não há Acordo que resista ou se imponha.
A Língua Portuguesa tem destas coisas e há palavras cuja versatilidade é practicamente imbatível.
A palavra merda é um bom exemplo. É inegável que a utilizamos em variadíssimas circunstâncias, mesmo que em silêncio, e em relação a muitas e variadas coisas. Senão vejamos.

Orientação geográfica:
Vai à m...!

Adjectivo qualificativo:
Tu és uma m...!

Momento de cepticismo:
Não acredito nesta m...!

Desejo de vingança:
Vou fazê-lo em m...!

Trapalhada:
Já fizeste m...!

Efeito visual:
Não se vê m... nenhuma!

Sensação olfactiva:
Cheira a m...!

Dúvida na despedida:
Por que é que não vais à m...?

Especulação de conhecimento:
Que m... será esta?

Momento de surpresa:
Merda!

Sensação gustativa:
Isto sabe a m...!

Desejo de ânimo:
Anda-me rápido com essa m...!

Situação de desordem:
Isto está uma m...!

Rejeição, despeito:
O que é que esse m... pensa?

Para descobrir o paradeiro de qualquer coisa:
Não sei onde foi parar aquela m...

Interjeição comum:
Mas que m...!

A crise das 17:30h:
Vou-me embora desta m...!

Futebol:
Esta m... parece o BENFICA!

27.10.08

Porque hoje é MAANANTAI.


As minhas actrizes favoritas:

Emma Thompson.

26.10.08

Olha... amuou. Ó Victória, não era caso para tanto.





Então o rapaz vai ver um espectáculo e está ali sossegadito,
mas para ver tem que usar os olhinhos, caramba.
A montagem tem algumas falhas, a começar pela t-shirt do David Becas numas imagens Vs o blazer noutras.

25.10.08

À minha reine de Saba. Em Barcelona.

Aicha, pelo nosso Cheb Khaled, rei da Rai, música magrebina, muito bem acompanhado por Faudel e Rashid Taha, ao vivo. Só para quem gosta, mesmo. Como tu e eu. E encontrei esta versão de Didi. Para ti. Põe a música alto aí em casa e dança, dança, dança. Je t’embrasse, ma reine de Saba.

Comme si je n'existais pas,

elle est passée à côté de moi
Sans un regard, reine de Saba,
j'ai dit Aïcha prends tout est pour toi

Voici les perles les bijoux,
aussi l'or autour de ton cou
Les fruits, biens mûrs au goût de miel, ma vie,
Aïcha si tu m'aimes

J'irai où ton souffle nous mène,
dans les pays d'ivoire et des baignes
J'effacerai tes larmes ou tes peines,
rien n'est trop beau pour une si belle

Aïcha, Aïcha écoute moi,
Aïcha, Aïcha t'en vas pas
Aïcha, Aïcha regarde moi,
Aïcha, Aïcha réponds-moi

Je dirai les mots les poèmes,
je jouerai les musiques du ciel
Je prendrai les rayons du soleil,
pour éclairer tes yeux de reine

Aïcha, Aïcha écoute moi,
Aïcha, Aïcha t'en vas pas
Aïcha, Aïcha regarde moi,
Aïcha, Aïcha réponds-moi

Elle m'a dit: Garde tes tresors,
moi je vaux mieux que tout ça
Des barreaux sont des barreaux, même en or
Je veux les mêmes droits que toi
Du respect pour chaque jour,
moi je ne veux que de l'amour

...

24.10.08

O que há em Havana?

A propósito de um post sobre a fantástica e deliciosa Omara Portuondo, e entre trocas de comentários, perguntava-me a Leonor, dona de uma Estrada onde nos perdemos curva após curva, deixando-nos levar pela boa leitura que uma belíssima escrita proporciona, o que havia em Havana, fazendo-me pensar o que haveria de tão intrigante numa cidade perdida no tempo e gasta por ele, com um glamour que precisa ser encontrado, uma das cidades que mais me marcou, como a Ela, e uma das minhas preferidas. Resisti à tentação de lhe responder numa dessas curvas da Estrada e, enquanto me deixava embalar pelo frenético e melodioso som caribenho, decidi que a resposta seria dada aqui. Não sei o que há em Havana, dizia a Leonor. Eu vou arriscar uma tímida explicação, sabendo que ficará sempre aquém do que realmente há na antiga Villa de San Cristóbal de la Habana e que me faz guardá-la num lugar especial no meu coração. Primeiro, em Havana há Havana. Esta é a parte que nem me atrevo a justificar. Começo mal, eu sei. Para quem me continua a ler, depois de tão esfarrapada explicação inicial, direi que há mais coisas. Em Havana, cidade natal de Jose Martí, há cubanos, um povo culto e pobre, que um regime opressor de décadas não abafou a alegria e a genuína satisfação de conviver. Em Havana pairam histórias indecifráveis entre as paredes do Hotel Sevilha, do Nacional e do Ambos Mundos, segredadas por Hemingway, Graham Greene, Al Capone, Josephine Baker, ou Guevara. Em Havana há uma maresia que nos salpica o rosto no Malecón quando o sol se põe e o azul do céu dá lugar a uma cor vermelha alaranjada só existente no caleidoscópio de cores que essa velha marginal coloca sob os nossos olhos, enquanto nos deliciamos com um puro da Fábrica Partagas. Em Havana vive-se uma atmosfera única entre os daiquiris bebidos na Bodeguita del Medio e as noites perdidas em danças intermináveis nos braços de bailarinas exímias e vibrantes, até que a alvorada nos sussurre que a cidade que não dormiu, acordou, ao som do Mambo, da Salsa, da Rumba, do Merengue ou da Pachanga. Havana é histórica e monumental, envelhecida e jovem, nostálgica e arrebatadora, barroca e neo-clássica. Havana é pura e ingénua, senhora respeitável e mulher atrevida e provocadora no alto das varandas dos edifícios, ou ao abrigo das arcadas e dos páteos, onde o pecado inconfessado se adivinha. Havana é cor, é ritmo, é despudorada e inocente. Em Havana somos seduzidos pelo encanto dos extremos que se passeiam de mãos dadas, unidos pela personalidade e pelo carácter de quem não cedeu, ou se entregou. Só nós, que a vivemos, não conseguimos resistir e cedemos à sua magia, e nos entregamos a uma cidade que nos marca para sempre. Acho que isto é um pedaço, apenas um pedaço do que há em Havana.

Bom fim-de-semana.

22.10.08

Nada mau.

Para 12 aninhos não vai nada mal.

Feliz aniversário, companheiro.

Não esperava que te abandonasses, que tivesses decidido partir. Já te tinha dito isso, mas não vamos voltar a discutir. Acompanhei-te até ao último suspiro e foi a mim que dirigiste as tuas últimas palavras acompanhadas de um abanar de cabeça reprovando a minha saída breve da tua cabeceira para ir comprar cigarros. Diziam-me que talvez me ouvisses depois de teres fechado os olhos, entregue a um repouso que te apaziguava a dor. Fiz como combinámos. A vida não pára para quem não quer que ela pare. Como a minha e como a tua, até teres decidido o contrário. Li-te o jornal diariamente e comentei-o entre risadas, parecendo ver-te sorrir, por querer ver-te sorrir nesse teu repouso antes que o caminho da eternidade resolvesses trilhar. É bom continuarmos a conversar de vez em quando. Como fizemos este fim-de-semana que passou, no sábado, o dia do teu aniversário. Acho que gostaste da prenda que te ofereci. Sei que gostaste, o que me segredaste ao ouvido sempre foi genuíno. As pessoas que nos são queridas não partem, apenas deixamos de as ver, não é, pai?

Um dardo para a desconversa.

Caminhos que são um Privilégio para quem os escolhe e para quem por eles caminha, que é como quem diz, para quem os lê. O Verão estava prestes a chegar e Lá se fazia um convite para que se abrissem as cortinas, quando Os comentei pela primeira vez. Com um “esteja à vontade Mr. Mike”, foram-me franqueadas as portas de um Caminho onde a poesia, de que sou avesso, é rainha, a escrita soberana e a sensibilidade é a princesa que escolhe as imagens. Quatro meses depois desse primeiro passo, entre um caminho trilhado diariamente, foi-me atirado um Dardo inesperado, em reconhecimento de determinados valores. Cumpre-me aqui agradecer muito mais que o prémio atribuído. Agradecer, acima de tudo, terem-se aberto as cortinas no dia 2 Junho. E manifestar a satisfação de receber um prémio sem nunca ter deixado de ser o que eu sou e como eu sou. Gosto que seja assim. Obrigado.

21.10.08

Success.

“Success comes from good judgement.
Good judgement comes from experience.

Experience comes from bad judgement.”

Arthur Jones, fonder, Nautilus Sports/Medical Industries

20.10.08

Porque hoje (ainda) é segunda-feira.

As minhas actrizes favoritas:

Fay Dunaway

Mi casa es tu casa.

A distância que nos separa no que diz respeito às convicções e crenças religiosas não é menor, antes pelo contrário, do que aquela que jamais contribuirá para uma convergência de carácter ideológico ou político, entre nós. Os seus textos acho-os por vezes densos, difíceis de assimilar e reclamam uma exigência de concentração pouco compatível com o meu tempo livre. Em poucas palavras resumiria que nem sempre são fáceis. Mas não é contra o facilitismo e a preguiça que muitas vezes nos insurgimos? Não poderei, seria leviano e prematuro, e imprudente da minha parte, falar de Amizade. Ele compreender-me-à, estou certo. Mas deverei falar de Respeito e Admiração. Pela pessoa, que tive a oportunidade de conhecer pessoalmente e que, acima de tudo, tenho tido o privilégio de ir conhecendo. Pela sua cultura geral e literária. Pelo seu humor genuíno se bem que cirúrgico. Somos pessoas muito diferentes, mas nos tempos que correm, entre o modernismo obsessivo e o fingimento da tolerância e liberdade, agrada-me que, entre outras coisas, nos unam as suas sextas-feiras. Mi casa es tu casa é um convite que encerra um egoísmo e um oportunismo de que não me envergonho. É que não me apetece, não me apetece mesmo, caro Paulo, ler-te, e ao escrever na segunda pessoa do singular passo a usar de uma liberdade que não me foi concedida, mas dizia eu, que não me apetece ler-te apenas como comentador. Presumo que o teu blog estará em construção. Contudo, e enquanto ele não conhece a luz do dia, mi casa es tu casa. Não sou homem de assinar contratos, continuo a acreditar em gentlemen agreements, e não sou homem de abrir a porta e franquear a passagem de minha casa a qualquer pessoa. Ficas até quando quiseres, combinamos a entrega da chave e sei que a convivência, entre as diferenças que não são poucas, que nos separam, será salutar. Aqui apenas se desconversa, e assim será até que deixe de me divertir e que pare de constituir uma terapia para o meu dia-a-dia. Aqui convive-se, sem que haja outro compromisso que não seja para com o respeito pelo próximo e educação. Este blog nasceu para mim, não para os outros que, serão sempre bem vindos, enquanto o desejarem.

Uma palavra final para o Corta-Fitas. Não, não me lerão críticas. Não me deixarei envolver emocionalmente pelo assunto, nem usar, em vão, o nome da democracia ou da tolerância de ideias. O Corta-Fitas é propriedade privada e encaro-o como se de uma empresa se tratasse, onde cabe a um conselho de administração decidir de acordo com a filosofia, interesses e objectivos da companhia. Acho estranho que se tivesse contratado um avançado criativo e se lhe exigisse fazer trabalho de cobertura a meio campo, manietado pela táctica que o futebol moderno exige. Mas isso sou eu, não quem deve mandar. Como dizia a Teresa Ribeiro, do que se passa no Convento, sabe quem está lá dentro.

Não voltarei a reler este texto, apesar de ter a sensação de estar assente numa escrita atabalhoada e quiçá, com erros de palmatória. Neste caso, em particular, interessa-me mais e privilegiei o conteúdo, não a forma.

15.10.08

És linda sim.

A mãozinha é uma gracinha, o cabelo longo e cuidado. A sobrancelha bem desenhada, os glúteos firmes e as coxas bem torneadas. Cinturinha de vespa, a pele sedosa e macia com um aroma a alfazema. És linda e irresistível, sim.

14.10.08

Não haja ilusões. A matemática é implacável.

Para quem pensa, comece a ficar eufórico e tenha a memória curta, não é o meu caso, que nas últimas duas semanas perdeu 25% dos 100.000 Euros na Bolsa e nos últimos dois dias ganhou 5% porque as acções onde o dinheiro estava investido subiram 30%, desengane-se que a matemática é implacável. 100.000 – 25% = 75.000. 75.000 + 30% = 97.500. Os ganhos? Desculpem, as perdas? 2,5%. Basta consultar o extracto.

Hammerichsgade, 1. Copenhaga, Dinamarca.


Nas grandes cidades é difícil viver os hotéis deixando-nos contagiar pelo clima que nos rodeia e envolve, e entregarmo-nos a eles de modo a sentirmo-nos impregnados pela atmosfera do nosso abrigo fugaz, de breves dias. Ao contrário do campo ou da praia, normalmente nas grandes cidades bastam-nos elas e o que nelas procuramos, sejam quais forem os interesses que nos impulsionaram a partir à sua descoberta. No campo ou na praia, especialmente no campo, a nossa relação com os hotéis é mais afectiva e exponencia o estreitar da relação com o local. Eu pelo menos sinto assim. Mas existem excepções que confirmam a minha, e apenas minha, regra. O Royal Hotel é uma delas. A Dinamarca é, muito provavelmente, o país mais latino entre os que constituem a Escandinávia, ou não fosse ele, também, o mais meridional. Mas isso não torna, aos meus olhos, Copenhaga uma cidade menos austera, apesar do seu encanto e da forma acolhedora como os seus habitantes nos recebem. Quando olhamos de fora para o Royal Hotel, é impossível não sermos imediatamente confrontados com uma modernidade impessoal. Mas no seu interior somos contagiados pela concepção e decoração magníficas do arquitecto dinamarquês Arne Jacobsen, ele que também é um talentoso desenhador de mobiliário e foi o criador das famosas Egg e Swan chairs, assim como da menos conhecida e rara Drop chair. Tive o privilégio de ficar hospedado na Suite 606 e de estar rodeado e sentir-me envolvido por uma atmosfera única proporcionada por um hotel que não esquecerei, mesmo tratando-se de uma visita profissional. Pela minha experiência, são poucas, mas o Royal Hotel constitui uma excepção à tal regra, um local onde, paradoxalmente, se agitam os sentidos e se apazigua o espírito, e que me fez olhar e viver Copenhaga com outros olhos e outro sentir.

13.10.08

Achei estranho.

Não conheço Helena Fazenda. Só sei que é procuradora e que tem à sua responsabilidade o processo “Noite Branca” relativo à morte de empresários da noite no Porto. Hoje, entre várias notícias, uma delas àcerca dos 217 milhões % (?!?!?!?!) de inflacção no Zimbabwe de Mugabe, só no mês de Julho, fiquei surpreso com a afirmação convicta da procuradora e das explicações que a suportam, sobre o roubo do seu computador portátil onde, alegadamente e naturalmente, digo eu, haveria informação confidencial relativa ao processo. Diz Helena Fazenda que o assalto a sua casa foi um acto fortuito e sem relação com a sua actividade profissional, designadamente com as investigações. Franzi o sobrolho. Continua a procuradora, justificando a sua certeza com o facto de lhe terem furtado outros valores como antiguidades, dinheiro, ouro e jóias. Pasmei. Coloquei-me na pele de um possível mandatário do acto, sim porque se tivesse interesse em ter acesso à informação contrataria quem fizesse o serviço, e imaginei-me a dar instruções precisas para que o assalto parecesse um acto fortuito que apontasse para um crime contra o património, como concluiu de pronto a PJ. Tudo aponta para que os suspeitos estejam já identificados, mas o caso não impediu que me sentisse desconfortável e admirado com tanta certeza. É que eu não sou procurador nem investigador criminal, mas a facilidade com que me coloquei na pele do tal possível mandatário foi a mesma com que me colocaria na pele da procuradora. Acharia estranho e não teria tanta certeza.

Casual nude?

Ele está farto de lhe dizer que não gosta que saia à rua naquele propósito. Cansado! Mas é inútil. Ela insiste em fazer ouvidos de mercador, sorri para ele no hall de entrada, manda-lhe um beijo esvoaçante e perfumado que atravessa a sala, e antes que chegue, quem o recebe já está entregue à inevitabilidade de pensamentos pecaminosos envoltos em ciúme. Vira-lhe as costas, decidida, e sai. Ele acompanha-lhe os movimentos e pensa para com os botões da camisa que terá de passar a ferro, que, afinal de contas, qualquer trapinho lhe fica bem. Que é o mesmo que dizer que qualquer trapinho lhe fica a mais. Casual nude, diz ela.

12.10.08

Observações e interrogações.

A Humanidade passa muito tempo a questionar se há vida depois da morte.
A minha observação da Humanidade leva-me a questionar se há vida e que vida há, antes da morte.

Incongruências. (continuação)

Que amor teria que ser esse, se é que genuinamente existe, capaz de nos fazer amar alguém sem que o respeito lhe estivesse associado? Aparentemente amor nenhum. Os anos passam por mim e aprendo o verdadeiro significado de um amor que faz com que conceba amar sem porventura respeitar. O amor incondicional. Estou grato por nunca ter convivido com tal situação extrema, ou ter sido submetido a tão severa prova. Mas hoje concebo a possibilidade de amar mesmo na eventualidade do respeito acabar. Uma incongruência que no meu caso deve ser multiplicada por cinco. Cinco das grandes incongruências da minha vida têm nomes. Os nomes dos meus quatro filhos e o da minha mãe.

11.10.08

Mezinhas caseiras nem sempre são a solução.

Numa visita de rotina ao médico, o Zé viu-se confrontado com algumas perguntas da praxe, às quais foi dando respostas que manifestaram uma honestidade invulgar e exemplar.
Você fuma, Zé?
Pouco, doutor.
E bebe?
Moderadamente doutor.
E faz desporto?
Não doutor, isso não faço. Por causa de lesões antigas, sabe?
E sexo, Zé?
Pouco, doutor. Muito pouco.
Isso é que não pode ser, Zé. Você devia fazer mais sexo para compensar a falta de prática desportiva. É o melhor que pode fazer.
!?!?!
O bom do Zé chega a casa e comenta com a mulher o resultado da consulta de rotina. Ela sorri, feliz, entregando-lhe descaradamente um sorriso devasso e provocador, não contando com a cumplicidade e reciprocidade do marido, que se encaminhou para a casa de banho. Tomou um banho, barbeou-se, vestiu-se elegantemente e perfumou-se, preparando-se para sair. A mulher esperava-o, vestindo uma lingerie sexy, com o mesmo sorriso devasso que só um desejo inconfessado poderia provocar.
Onde julgas tu que vais, homem?
Ora, esqueceste-te do que o médico disse? Vou fazer sexo.
????!!!????
O que foi?
Então, eu aqui, pronta para ti e tu...
Oh Francisca, deixa-te disso... lá estás tu com a mania dos teus remédios caseiros, mulher.

10.10.08

O mar e algumas mãos amigas.

O poder de atracção que o mar sempre teve em mim é inegável e conhecido. Quase um chamamento inexplicável e nada racional que faz com que o rumo seja, invariavelmente, aquele que me leva para a imensidão de água revolta e espuma branca no areal, e onde descanso os olhos numa linha imaginária que há muito tempo deixei de ver, deixando que o meu espírito navegue, inquieto e agitado, até que o imaginado para além dessa linha me preencha a alma. Inevitavelmente, mesmo que involuntariamente, deixo que as vozes marítimas soem aos ouvidos das minhas crias, cantadas por coros afinados de sereias magistralmente dirigidas por Neptuno, maestro e senhor dos mares e oceanos. Mas o chamamento que me enfeitiça e me leva para oeste, é o mesmo que me impede de ouvir outras vozes sussurradas que me transportariam para leste. Para o interior, para onde as raízes terrenas e ancestrais me devolveriam parte da História. Uma Mão Amiga deu origem a este post e teve o condão de me fazer reflectir sobre o que, sem que seja voluntariamente, poderei estar a sequestrar às crias. Afinal, e aqui cabe a confissão, poderá não ser somente o mar o “culpado”, mas também a alma desenraizada que coabita comigo e em mim. Atento ficarei às vozes que me chegam, em brisas desconhecidas por mim, sopradas por Minerva, senhora da sabedoria e do conhecimento, para que esta atracção e esta paixão cega, não sendo genética, hereditária não se torne. Descanso, repousado numa tranquilidade clandestina, egoísta e preguiçosa, por saber que as crias têm mães que as farão ouvir as vozes de Minerva. Mas numa promessa velada e tímida, respondo em silêncio à minha voz calada que me diz dever fazer um esforço para as escutar. Não por mim, que já pouco poderei fazer, tanta é a água salgada que me corre nas veias, a constante procura da brisa marítima que me molha o rosto e o confronto a que não resisto submeter-me com as vagas que se levantam no meu mar querido. Mas por elas, as crias.

Bom fim-de-semana.

8.10.08

Incongruências.

Procurando nunca julgar, critico, reprovo, afasto ou ignoro, seja por palavras ou por gestos. Não sou diferente do cidadão comum quando revelo esse tipo de atitudes, após ser confrontado com outras que colidem com os meus valores, princípios ou forma de pensar, mesmo assumindo que de preconceitos se poderão tratar da minha parte, em alguns casos. Somos capazes de deixar de amar ou respeitar por causa dos actos de outras pessoas, dependendo para tal a gravidade de tais actos, mesmo que não tenham directamente a ver connosco. Amar e respeitar, dois sentimentos indissociáveis na relação entre seres humanos, quando o ponto de partida é amar. Conseguimos conceber amar alguém depois do respeito acabar?

(continua)

Quando se começa um negócio deve-se fechá-lo. E bem.

Numa Porta que é do Vento, aborda-se o tema, bem escrito, de forma inteligente e curiosa, mas não menos controversa. O que é verdadeiramente importante quando se fala de cama é a intimidade criada pelo casal, uma conquista lenta, valiosa e insuperável, para usar as palavras que o Vento fez passar pela Porta, e o equilíbio que se adquire entre os que nela se deitam, para além do exacerbar dos cinco sentidos e da tal química, sem a qual a boa cama parece incompleta. E não se poderá falar de experiência mas sim de padrões que só ao casal cabe estabelecer. Pára aí! Quando o assunto é cama, não conseguimos resistir à tentação de evocar palavras e conceitos que contribuem para dourar a narrativa, tornando-a quase enternecedora e muitas vezes evitando a palavra sexo. Sem recorrer a estudos sobre o tema, que são como os que são feitos para aferir a inteligência, na maior parte deles falaciosos (não sei bem porquê, mas soa-me bem esta palavra neste contexto), nenhuma teoria me demove da ideia de que, para se ter boa cama, em primeiro lugar é preciso gostar-se de cama. Como um bom nadador precisa gostar de água e de nadar, ou um bom pianista precisa gostar de música e de tocar piano. Mas andemos para trás que este assunto, a meu ver, tem semelhanças com a dualidade de se abordar um negócio e fechá-lo. Duas etapas importantes em que a eficácia do negócio depende de ambas. Encaremos a abordagem ao negócio como os preliminares. Uma boa cama à noite começa com preliminares de manhã, que se prolongam durante o dia. Mas um negócio deve fechar-se. Working on it é interessante mas não desvalorizemos o do it. E fechar-se o negócio tem a ver com sexo. Cama é química e é legítimo enaltecê-la, mas também é sexo, por isso não me parece honesto contornar a física. E size matters, claro. O inverso foi criado pelas mulheres, aliando à genuinidade da afirmação um conteúdo carinhoso e enternecedor que tranquiliza os homens. Não se trincha um peru com uma faca de sobemesa ou de barrar manteiga, pois não?

5.10.08

Recantos de uma Lisboa que se os lisboetas quisessem também seria deles.

Há seis meses atrás escrevi umas breves linhas sobre um lugar que, paradoxalmente, evoca a noite mas onde se privilegia a luz. Disse que tinha gostado do que tinha lido, visto e ouvido. E que nos tempos que correm, em que a Natureza e o campo são valorizados e se sobrepõem à cidade, esse lugar nos trazia (e continua a trazer) uma Lisboa do dia-a-dia reflectida em fachadas com vida. E histórias do quotidiano contadas numa prosa poética, embalada em muito boa música. Hoje lembrei-me desse lugar, e da prosa que sendo poética não é menos real, quando passeava com os meus filhos mais novos depois de jantar, já o sol se tinha escondido dando lugar a uma noite límpida e tranquila. Os rapazes de bicicleta e a menina de patins, desfrutando despreocupadamente da serenidade da noite e de uma rua deserta ao lado de casa, sem que antes, imagine-se, tivéssemos tirado proveito do pavimento liso da estátua de Santo António, onde a Avenida de Roma se cruza com a da Igreja. E lembrei-me de uma Angola nocturna, de ruas sem carros num Lobito longínquo. Rimo-nos os três, cairam, eles dois, e aperfeiçoámos a disciplina e o método de nos confrontarmos com um ou outro automóvel que se atreveu a atravessar a nossa rua, numa apropriação singular e divertida. Pensei que as pessoas, muitas delas infelizmente não o podem fazer, mas outras poderão, deviam chamar a si o que lhes é devido, e porque não dizer, lhes pertence, se estivessem dispostas, claro está, a abdicar de outras coisas. Um destes dias peço, ou lanço o desafio à dona daquele lugar de que falei, que fotografe essa Lisboa que vivi este fim-de-semana. Porque eu apenas a soube viver, jamais a saberei fotografar. E acreditem que podia ser uma Lisboa de mais lisboetas do que muitos deles pensam. Se eles quisessem.

A foto, tirada da net, não é de nenhum dos recantos de que falo. Apenas ilustra a rua que vivi este fim-de-semana com os infantes.

Não tenho nada contra as rugas numa mulher.

4.10.08

Vai levar muito tempo até envelhecer.

Vinte anos separam-no da irmã mais velha. Não me considero um pai tardio, antes um pai precoce, o que me torna, em alguns momentos, quase avô do mais novo, no meu quase meio século de vida. Para meu bem e para bem dele, que me saiu um corsário de fazer corar de vergonha o Barba Ruiva. Desisiti sequer de comentar com quem me é próximo, quão difícil é esse mini-corsário para evitar ouvir conselhos em tom paternalista de quem se esquece, os que não sabem sempre contaram com a minha compreensão e tolerância, dizia eu, de quem se esquece que é o meu quarto filho, não o primeiro. Sem falsa modéstia, posso afirmar que tarimba não me falta. Quando temos mais que um filho, lá vem a tal gestão de afectos impossível de contornar, conseguimos racionalizar e fazer uma espécie de enquadramento da relação entre nós. Provavelmente comigo é até mais fácil pelas diferenças de idades que os separam e pela vivência e histórias de vida que se foram desenrolando entre mim e eles. Amizade, companheirismo, sedução ou paixão, são adjectivos que podem qualificar nichos relacionais que desenvolvemos com cada um dos filhos. Com a amostra de corsário existe, definitivamente, uma relação de paixão. Uma relação de extremos, sempre nos limites, onde o meio termo não tem lugar. Ele foi, é e está a ser, a causa que me levou e leva permanentemente, a reequacionar o papel de pai. Sinto que sou melhor pai agora do que fui há uns anos atrás. É normal. Contudo tenho muito mais dúvidas e questiono mais vezes o meu papel de progenitor hoje do que fazia antes. Há dias comemorou o seu quarto aniversário e a prenda, uma surpresa que não imaginava, foi uma bicicleta de rapaz. Daquelas que, apesar de ter rodinhas, já é uma bicicleta a sério e de bombeiro. Daí para cá não temos feito outra coisa senão pedalar, o que me leva a ponderar retirar as ditas rodinhas antes de tempo. E digo temos porque me vi a pedalar outra vez na minha velha bicicleta. Logo eu que achava que a tinha arrumado definitivamente. Creio que vai levar bastante tempo até que envelheça. Bastante tempo até conhecer a serenidade das pantufas calçadas. Não tenho opção. E isso, sem que ele saiba, devo-o também ao corsário.

2.10.08

Vai estoirar ou...?

O meu pai, apesar de entender as explicações que lhe eram dadas, sempre achou estranho e de difícil compreensão, que alguém que tivesse um negócio, fechasse a porta do estabelecimento às sete da tarde, fosse para casa ter com a família, jantasse, dormisse uma noite descansada e no dia seguinte às nove horas, quando abrisse a porta, a empresa valesse mais sem que tivesse vendido um único produto, ou tivesse criado mais emprego, ou gerado qualquer tipo de riqueza. Como também tinha dificuldade em entender o inverso, ou seja, que a empresa valesse menos sem que tivesse sido assaltada, ou tivesse havido um incêndio, ou outra calamidade. Isto um dia vai estoirar, dizia ele. A minha compreensão foi mais além, apesar de ter que me esforçar e de entender a sua estranheza e cepticismo. Mas não foi suficientemente além para compreender a injecção de 700 bilhões de dólares para salvar um sistema falido e muito menos para compreender o facto desse dinheiro ir direitinho para as mãos de quem contribuiu para a sua falência. Consta que os prémios dos executivos das empresas americanas em causa e que foram a causa, rondaram um total de 10 milhões de dólares. A meu ver, foi muito dinheiro para recompensar uma incompetência que se vê novamente recompensada com o dinheiro dos contribuintes americanos. Bem sei que dificilmente haveria outra opção e que o dinheiro dos contribuintes acabaria invariavelmente, como acaba quase sempre, por ser a tábua de salvação, quiçá até de uma forma ainda mais penosa. Observo mercados em pânico, e não só na Terra do Tio Sam, mas por causa dela, pequenas economias de uma vida inteira de trabalho em risco, economias de países num permanente vacilar e confesso a minha incapacidade de compreesão para o facto de tudo isso poder estar nas mãos de meia dúzia de executivos e conselhos de administração pagos principescamente, para não dizer pornograficamente, e assistir ao premiar de tamanha incompetência, para não dizer leviandade ou preversidade. Espero que desta vez sejam criados mecanismos de controle para, no mínimo, os 700 bilhões não irem parar às mãos dos suspeitos do costume, contudo, acho que tinhas razão, pai. E não é um dia que vai estoirar. Já estoirou, apesar de, aparentemente, o dinheiro tudo apagar, mantendo um sistema falido. Já estoirou porque vivemos uma mentira velada.

Olha, fecharam-me a porta.

E desconfio que sei quem foi.

Depois haverei de indagar quem me pregou esta partida.

Agora há que procurar um serralheiro.

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