2.10.08

Vai estoirar ou...?

O meu pai, apesar de entender as explicações que lhe eram dadas, sempre achou estranho e de difícil compreensão, que alguém que tivesse um negócio, fechasse a porta do estabelecimento às sete da tarde, fosse para casa ter com a família, jantasse, dormisse uma noite descansada e no dia seguinte às nove horas, quando abrisse a porta, a empresa valesse mais sem que tivesse vendido um único produto, ou tivesse criado mais emprego, ou gerado qualquer tipo de riqueza. Como também tinha dificuldade em entender o inverso, ou seja, que a empresa valesse menos sem que tivesse sido assaltada, ou tivesse havido um incêndio, ou outra calamidade. Isto um dia vai estoirar, dizia ele. A minha compreensão foi mais além, apesar de ter que me esforçar e de entender a sua estranheza e cepticismo. Mas não foi suficientemente além para compreender a injecção de 700 bilhões de dólares para salvar um sistema falido e muito menos para compreender o facto desse dinheiro ir direitinho para as mãos de quem contribuiu para a sua falência. Consta que os prémios dos executivos das empresas americanas em causa e que foram a causa, rondaram um total de 10 milhões de dólares. A meu ver, foi muito dinheiro para recompensar uma incompetência que se vê novamente recompensada com o dinheiro dos contribuintes americanos. Bem sei que dificilmente haveria outra opção e que o dinheiro dos contribuintes acabaria invariavelmente, como acaba quase sempre, por ser a tábua de salvação, quiçá até de uma forma ainda mais penosa. Observo mercados em pânico, e não só na Terra do Tio Sam, mas por causa dela, pequenas economias de uma vida inteira de trabalho em risco, economias de países num permanente vacilar e confesso a minha incapacidade de compreesão para o facto de tudo isso poder estar nas mãos de meia dúzia de executivos e conselhos de administração pagos principescamente, para não dizer pornograficamente, e assistir ao premiar de tamanha incompetência, para não dizer leviandade ou preversidade. Espero que desta vez sejam criados mecanismos de controle para, no mínimo, os 700 bilhões não irem parar às mãos dos suspeitos do costume, contudo, acho que tinhas razão, pai. E não é um dia que vai estoirar. Já estoirou, apesar de, aparentemente, o dinheiro tudo apagar, mantendo um sistema falido. Já estoirou porque vivemos uma mentira velada.

20 comentários:

Ricardo M Santos disse...

é uma questão de tempo. Pena que vai rebentar em cima dos mesmos de sempre, porque para os responsáveis haverá sempre um paulson milagreiro

Lina Arroja (GJ) disse...

Pois, estamos de acordo. Daí a nova ordem social e novos lideres mesmo que pareça pouco provável. É que o estoiro ainda não terminou. Lamentavelmente tem réplicas bem fortes.

Anónimo disse...

Bem vindo, RMS. O seu comentário fez-me lembrar qualquer coisa que metia o mexilhão pelo meio... ;-)

Anónimo disse...

Ah, Grande Jóia, essa sua louvável e inabalável convicção numa nova ordem social e em novos líderes... :-)

Lina Arroja (GJ) disse...

Olhe lá se eu deixei de acreditar no rapaz Obama, ainda é cedo para cantar vitória, mas...terei eu e muitos outros razão para acreditar que o jogo está a favor?

Luísa A. disse...

Não me passa pela cabeça, Mike - e espero que não passe pela de ninguém com responsabilidades políticas - que, a haver a tal injecção dos 700 biliões, o dinheiro vá direitinho para as mãos de quem contribuiu ou criou o problema. Essa gente tem de ser castigada (nem que seja com a vergonha da expulsão do mundo dos negócios e da alta finança), porque, jogando a perder com o que não era seu, cometeu um crime contra a propriedade (alheia) só superado, em gravidade, pelo crime contra a vida ou a integridade física. Aliás, não poderá deixar de fazer parte da futura regulação do sistema o estabelecimento de um quadro penal para este tipo de crimes e de criminosos. Tem de ser!… ;-)

Anónimo disse...

Mas assim é que deve ser, Grande Jóia. :-)

Anónimo disse...

A mim também não me passaria pela cabeça, Luísa, mas... já vi tanta coisa. Mesmo muitas que tinham que ser e afinal... ;-)

José, o Alfredo disse...

O maior problema é que somos todos filhos de Cristo, que não sabia nada de finanças, não consta que tivesse biblioteca e acreditava em dar a outra face. Outro problema é que nem todos tiveram pais que lhes incutissem valores (refiro-me aos morais).

ana v. disse...

Caramba, Mike, como eu lhe dou razão... já nem falo de apurar culpas, o que me parece é que salvar a qualquer preço um sistema que se provou estar falido só vai adiar (e agravar mais ainda) o estado das coisas. Também acredito numa nova ordem social, mas tem de ser muito diferente da actual. Tudo é cíclico, e a que vigora ainda já deu tudo o que tinha a dar. O problema é que as mudanças não se fazem sem grandes convulsões e elas estão aí, para quem as quiser ver e não tapar o sol com a peneira.
Os tempos que se avizinham não serão fáceis para ninguém, infelizmente...

Anónimo disse...

Voltaste a fazer-me lembrar do mexilhão, José.

Anónimo disse...

E porque é que a menina Ana acha que eu já há algum tempo lhe falo em virar frangos num longínquo canto do mundo? Ando à procura de um sítio onde não saia chamuscado, nem os frangos, claro. :-)

ana v. disse...

Pois é, dou-lhe razão mais uma vez. E quando encontrar esse sítio onde não se fica chamuscado... avise, ok?
;)

Anónimo disse...

Se prometer guardar segredo... ;-)

ana v. disse...

Transformo-o em flores, boa? (risos)

Anónimo disse...

Com tanto segredo e transformação, daqui a nada sou um sapo... (muitos risos).

Paulo Cunha Porto disse...

Quanto à sã estranheza Paterna, Caro Mike, num sentido diverso do que vingou, a chave é A BOLSA OU A VIDA!
Tenhamos coragem de escolher a vida.
Quanto ao destino dos milhões, todo aquele país gosta disso. Não sobre para o lado de cá...
Abraço

Anónimo disse...

Caro Paulo, acabou de destruir um sonho de infância. Eu que pensava que não tinha que escolher entre ambas e afinal o meu Amigo, implacável no seu raciocínio, deita por terra uma crença minha.
Abraço.

Miss Dalloway disse...

não podia ser mais certo um sistema falido!!

Anónimo disse...

Também creio, Miss Dalloway.

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