31.8.08

O que é que Moscovo tem a ver com frangos?


Tudo! E não porque considere as tropas do Eixo e as de Napoleão frangos caídos nas mãos do Exército Vermelho. Antes de mais devo agradecer à Luísa que, simpaticamente, me deu a conhecer a visão esclarecida e lúcida de Putin relativamente a um assunto que, não sendo estratégico para o resto do mundo, é para mim. Bem sei que muitos torcerão o nariz a esta tentação de emigrar para uma metrópole como Moscovo, apesar de, segundo sei, ser uma cidade maravilhosa. Contras não faltam, é bem verdade. A língua, a máfia russa, o frio, a cultura tão diferente de um povo, etc. Mas vejamos pelo lado positivo. A língua aprende-se e para quem faz a vida a virar frangos, a língua que interessa é o sabor dos frangos e o dinheiro com que são pagos. A máfia russa deve ter mais com que se entreter do que com um virador de frangos português e como não sou pessoa de ostentar sinais exteriores de riqueza, quando o negócio me tornar milionário, continuarei a andar de metro. E ao andar de metro, para além de ser um prazer, fujo ao frio, por isso as baixas temperaturas são um assunto ultrapassado. Quanto à cultura do povo, conto adaptar-me com facilidade. Se sempre aconteceu comigo, porque não acontecerá agora? Contrato funcionárias nativas como ajudantes, ensino-lhes a virar frangos e depressa estarei moscovitamente aculturado. Como sou um publicitário experiente, saberei cuidar da minha marca e promover o produto a preceito. Nada como umas miúdas giras, consta que em Moscovo não há falta desses espécimes, a passear de saltos altos com um cartaz a cobrir-lhes o corpo nu, para que os frangos do Mikhail se tornem os mais apetecidos da cidade. Aceitarei rublos e não me farei rogado a negociar preços em pacote em euros e dólares. Com o sucesso, não cairei na tentação de conceber uma segunda marca, mais sofisticada, para os endinheirados, que os há e muitos em Moscovo, não fosse vir a ter a máfia russa à perna. É que invejosos também os há em todo o lado. Restam poucas dúvidas. Moscovo tem tudo a ver com frangos e se, à partida, não terá tudo a ver comigo, saberei fazer com que tenha. Благодарность, Luísa.

Foram boas as férias. Férias?

Deitar tarde porque os mais velhos precisam de atenção levantar cedo porque o mais novo é madrugador pequenos-almoços mergulhos matinais na piscina e jogos de futebol no jardim preparar os lanchinhos para a praia e arrumar os sacos de praia não esquecer de espalhar o creme protector fazer castelos na areia e estradas e túneis apanhar ondas mesmo as grandes que a bandeira está verde mais uns jogos de futebol e de raquetes lançar o papagaio que o vento está de feição comer gelados voltar para casa mais uns mergulhos na piscina há quem queira uma tosta mista especial feita pelo pai e mais outra que estava muito boa pensar o que será o jantar enquanto os banhos são tomados fazer o jantar arrumar a cozinha verificar se as toalhas de praia não ficaram espalhadas no jardim para não as termos molhadas no dia seguinte por causa da rega automática ver um filme com o mais novo ultrapassar uma birra que o combate ao sono é um combate perdido deitar o caçula ver um filme com a mais nova jogar cartas com os mais velhos os olhos fecham-se estou cansado estou de férias deito-me abro um livro e consigo ler meia página. Deitar tarde porque os mais velhos precisam de atenção levantar cedo porque o mais novo é madrugador pequenos-almoços mergulhos matinais na piscina e jogos de futebol no jardim preparar os lanchinhos para a praia e arrumar os sacos de praia não esquecer de espalhar o creme protector fazer castelos na areia e estradas e túneis apanhar ondas mesmo as grandes que a bandeira está verde mais uns jogos de futebol e de raquetes lançar o papagaio que o vento está de feição comer gelados voltar para casa mais uns mergulhos na piscina há quem queira uma tosta mista especial feita pelo pai e mais outra que estava muito boa pensar o que será o jantar enquanto os banhos são tomados fazer o jantar arrumar a cozinha verificar se as toalhas de praia não ficaram espalhadas no jardim para não as termos molhadas no dia seguinte por causa da rega automática ver um filme com o mais novo ultrapassar uma birra que o combate ao sono é um combate perdido deitar o caçula ver um filme com a mais nova jogar cartas com os mais velhos os olhos fecham-se estou cansado estou de férias deito-me abro um livro e consigo ler meia página.

O meu dia-a-dia multiplicado por dois e não por quinze para poupar quem me leu pelo menos até metade. Para o ano a casa terá que ter mais um quarto porque levo uma babysitter, de preferência brasileira para os miúdos se entenderem com ela. Foram boas as férias, mas preciso de férias.

6.8.08

Boas férias.

Boas férias, para quem ainda não as gozou, como é o meu caso. Estarei de férias, e não levo computador, o que não equivale a dizer que não estarei ocupado.

Sexta-feira é quando um homem quiser. Até pode ser à quarta.

Caro Réprobo, folgo em sabê-lo de boa saúde e adivinho muito boa disposição neste período sabático. Tenho a sensação que esta fotografia não será alvo da aprovação das pessoas que me visitam, que acharão que desta vez fui longe demais. Tudo por culpa, verdade seja dita, do topless inocente que deixa à vista de todos o peito perfeito e sublime da menina que olha embevecida para o meu amigo. É óbvio que tive o cuidado de o retirar da foto, apenas e só por respeitar a vontade que expressou. Imagino que, numa primeira apreciação, as pessoas se interroguem quem é a atriz ou o modelo que ilustra esta quarta-feira. Não tive coragem, nem creio ter legitimidade para ocupar a sexta-feira, um dia que lhe pertence por direito próprio. Para quem ainda me esteja a ler, gostaria de deixar claro que se trata de uma senhora anónima, uma ilustre desconhecida de todos. Que mulher, meu Caro! Um sorriso encantador, uns lábios desenhados na perfeição, o cabelo preso que o vento desarrumou a preceito, dando-he um ar elegantemente selvagem, e uma pele bronzeada cobrindo um corpo que se adivinha escultural. Meu caro, o senhor é um felizardo. Aproveito, antes de me despedir, para lhe dar conta, mesmo que de forma resumida, das mais recentes novidades do burgo. Sabe, eu meti-me em trabalhos por causa de um comentário inocente lá pelo Nocturno. A Ana, que agora resolveu abrir a porta à ventania às segundas-feiras, contando com a cumplicidade preversa da Luísa, arranjou maneira de me destruir e ainda hoje ando a apanhar o que restou de mim, veja lá. A Fugidia diz que anda cheia de trabalho, que não sabe para onde se há-de virar e o cachorro adoeceu. Ela queixa-se mas ainda arranja tempo para fazer pão e bolinhos. Vá-se lá saber como entender as senhoras. Eu, quanto mais velho, menos as entendo e por isso mesmo, já desisti de o fazer há algum tempo. A Cristina meteu-se em trabalhos. Consta que um blogger foi lá a casa e o blog ficou inoperante. Desconfio, aqui entre nós, que ficou alguma conta por pagar. Espero que ela não leia isto, que deve ficar sentida, mas como o estado actual é sentido, talvez não esteja a ferir susceptibilidades. A Júlia está de férias. Passa por aqui de vez em quando, leve e vaporosa, e tanto deixa beijinhos, como dá reprimendas implacáveis. Sabe como é, não sabe? Lá para os lados de quem corta fitas, as sextas-feiras não melhoraram, antes pelo contrário. Estão cada vez mais longe da qualidade das suas. Olhe, despeço-me, reforçando o facto de esperarmos pela sua chegada. Eu, pessoalmente, fico na expectativa, e já agora deixo aqui o pedido, que volte numa sexta-feira, com ou sem nevoeiro. Desde que seja numa sexta-feira, meu Caro. E consigo creio não precisar de entrar em explicações. Ah, e mais uma vez, a moça é uma delícia. Um abraço.

Pai babado? Eu???




Gostarmos mais de nós próprios do que...

No visor do telemóvel vi o nome dele, um velho amigo de uma recente amizade, e com quem tenho o hábito de me encontrar de tempos em tempos. Atendi. Os cumprimentos do costume, as palavras cordiais, as perguntas habituais. Olá, estás bom, que é feito de ti, tens tido muito trabalho, como tem passado a tua mãe, e os miúdos? Respostas às perguntas numa reciprocidade cadenciada fizeram-me entender, pelo tom de voz, que cedo chegaria o pedido de um tempo meu para que o ouvisse sem ser pelo aparelho que tínhamos encostado ao ouvido. Vem cá a casa. Estou sozinho, mas olha, não tenho o que te dar para jantar, disse-lhe sabendo que era do meu tempo que se alimentaria naquela noite. Queres que leve vodka? não que tenho cá disso. Depois de ter chegado, rapidamente dispensámos as trivialidades para nos dedicarmos ao que o trazia. Divorciado, com filhos e pai presente apesar das contingências. Quantos de nós, ironia das ironias, não nos tornamos mais presentes depois da separação nos bater à porta, fazendo-nos repensar as prioridades da vida? Mas isso é outro assunto, que o que o tinha levado até cá a casa era, suspeitava eu, alguma gaveta mal fechada e que teima, por vezes, em impedir que nos sintamos completamente resolvidos, para usar um termo em voga. Mas não, para meu alívio, que o sabia ter vivido a grande paixão da vida dele, e quão destroçado ficara com a separação, sempre vivida com uma dignidade louvável. Afinal existia, entre várias, uma grande dúvida, que tinha tanto de grande como de boa, na minha opinião de amigo. Sentia-se curado. Curado de um mal que lhe atacara o coração e que o tempo, esse fiel amigo que nos ampara e que apenas nos pede paciência para o vivermos um dia a seguir ao outro, se mostrava relutante a colaborar. Ou seria a ferida que de tão grande ser exigia mais dele? A explicação chegou, sem que ele mesmo esperasse, quando me disse que sentia que já começava a gostar mais dele próprio que dela, da ex-mulher. Mesmo não sendo médico das malediciências do coração, arrisquei dizer-lhe que achava que estava curado, ou para lá caminhava a passos largos e seguros. Redescoberta sã, essa de gostarmos de nós, de nos disciplinarmos a colocarmo-nos em primeiro lugar, contra tudo o que é preconizado socialmente e, no caso dele, e porque não assumir no meu também, fruto de educação. Paradoxal? Não! Foi essa mesma educação que nos orientou, e bem, a pensarmos nos outros, mas que simultaneamente, deixou uma herança de amor próprio e auto-estima de que não devemos abdicar nunca. Ainda bem que havia vodka. Não que houvesse ainda alguma ferida que precisasse de álcool, mas a nós soube-nos bem.

5.8.08

Será tolo ou estará feliz?

Depende. Estou na dúvida e acho que vou continuar. Pode não ser tolo e estar apenas cansado. Não pode ser. É tolo e dorme, quando devia estar acordado. E assim perde a visão deslumbrante de um corpo delicioso e escultural, e de formas generosas de uma mulher bela e sedutora. Ou estará feliz? se está, acredito que seja a felicidade suprema. A dúvida permanece. Depende. Ela estará a chegar ou prepara-se para partir?

3.8.08

Um mísero orgasmo, ou a importância de um orgasmo fingido.

Ainda sobre o orgasmo, que o tema é, indiscutivelmente, prazeiroso. Mas agora sobre o fingir, um assunto, ou capacidade, que se acredita ser apenas do sexo feminino. Fingir prazer e fingir o orgasmo num acto sexual, coisa que, diz-se, apenas as mulheres conseguem, é, à partida, não muito bem aceite. Dei-me conta que é ainda menos bem aceite e mais perplexidade causa, o facto de um homem não se importar com isso. Sejamos sérios! Eu vou ser! A capacidade de uma mulher fingir um orgasmo é um facto. Trata-se apenas de mais uma lei da natureza que nunca poderá ser contrariada. Se ela o faz com o intuito de enganar o homem, não é abonatório para si. Porque em primeiro lugar está a enganar-se a ela própria. E nunca o homem, que jamais saberá que foi enganado. Mas ela poderá fazê-lo sem, contudo, ter esse intuito. O que a motiva a fingir, sem ninguém querer enganar, é que importa avaliar. Quantas mulheres não fingiram alegria na dor profunda? ou convicção na dúvida? ou coragem no temor? ou atitude no desespero? ou força na fraqueza? Porque o fizeram? Se a resposta for por amor, por um projecto de vida a dois, por um casamento feliz, mesmo que o momento fosse difícil, quem poderá atirar a primeira pedra? Lendo esta última frase, pergunto-me o que significa para uma mulher fingir um orgasmo com o homem que ama, com o homem com quem tem um projecto de vida, com o homem que ela escolheu como sendo o seu homem, o homem na sua vida. Neste contexto, e é neste contexto que interessa situarmo-nos para não tornar o tema denso, a discussão infinita e porque ele é a essência, se algum dia uma mulher que amei e por quem me senti amado, fingiu um orgasmo, não só não me importo, como ainda a admiro. Pelo que ela abdicou de si, pela dádiva, pelo que me deu por amor, pela relação em que acreditava. Se o fez para me enganar, tenho pena, mas dela e não de mim, porque se enganou apenas e só a si própria.

Filhos da Escola.

Um telefonema inesperado, atendido com relutância por se tratar de um número privado, fez com que andasse vinte seis anos para trás. Vinte seis anos que separavam mais de vinte homens, outrora jovens, que se conheceram quando a nação e o dever os chamou para prestarem o nada consensual, já naquela altura, serviço militar obrigatório. Se o serviço militar era obrigatório, o facto de termos sido todos, orgulhosamente, Fuzileiros Navais, deveu-se a um acto voluntário. Cada um de nós com as suas razões para termos sido voluntários numa tropa de elite. O Sam foi o principal responsável por termos jantado, ele que vive na Suécia desde que saiu da tropa, e para quem as visitas a Portugal são cada vez mais esporádicas. Falámos da vida que entretanto passou, das esposas, dos filhos, dos divórcios, dos empregos, das carreiras. Entre risos e gargalhadas relembrámos episódios e histórias passadas, como cadetes e futuros oficiais, durante a implacável e longa recruta de seis meses na Escola de Fuzileiros em Vale do Zebro. Afinal, e como um de nós fez questão de lembrar, somos todos “filhos da escola”, um nome carinhoso para quem passou por aquela Casa. Uma Casa onde se entra menino e sai-se homem, onde fomos levados e conhecer os nossos limites psicológicos e físicos, onde aprendemos o rigor, a camaradagem, a entrega e o espirito de equipa. Onde as experiências partilhadas pelos mais antigos, que conheceram a fronteira ténue da morte no Ultramar, nos deram uma perspectiva diferente da vida. Há mais de vinte anos que não dizia isto porque nunca encontrei compreensão e desisti de discutir o assunto. Tal como antes, hoje continuo a não esperar entendimento e manterei a minha recusa em discuti-lo. Apenas continuo a achar que nada substituiu o serviço militar obrigatório para as gerações de hoje. Ou melhor, algo o substituiu, mas algo incomparavelmente pior. Lembro-me bem dos argumentos contra, como se fosse hoje. Já não estamos em guerra, é um tempo perdido, cortam-se carreiras profissionais aos jovens, propaga-se uma mentalidade militarista, e por aí adiante. Tudo conversa fiada, de circunstância, sem conhecimento e politicamente correcta. Uma conversa que esquece a essência. A formação de homens. Os homens que muitos pais não formam, a escola também não o faz, a universidade idem, e a sociedade não está para aí virada, apenas se queixando que cada vez há menos homens, entre os seres do sexo masculino.

Há um ano atrás não consegui evitar um sorriso e escrever sobre isso, quando o Tomás Morais, responsável pela Selecção Nacional de Rugby que tanto orgulho devolveu aos portugueses quando participou no campeonato do mundo em França, decidiu que parte da preparação seria feita na Escola de Fuzileiros. Ele sabia que iria precisar de guerreiros mesmo em tempo de paz, que iria precisar de homens. E nesse campeonato, mesmo sem troféu, ao contrário de outros, também sem troféus, o país teve-os.