24.10.08

O que há em Havana?

A propósito de um post sobre a fantástica e deliciosa Omara Portuondo, e entre trocas de comentários, perguntava-me a Leonor, dona de uma Estrada onde nos perdemos curva após curva, deixando-nos levar pela boa leitura que uma belíssima escrita proporciona, o que havia em Havana, fazendo-me pensar o que haveria de tão intrigante numa cidade perdida no tempo e gasta por ele, com um glamour que precisa ser encontrado, uma das cidades que mais me marcou, como a Ela, e uma das minhas preferidas. Resisti à tentação de lhe responder numa dessas curvas da Estrada e, enquanto me deixava embalar pelo frenético e melodioso som caribenho, decidi que a resposta seria dada aqui. Não sei o que há em Havana, dizia a Leonor. Eu vou arriscar uma tímida explicação, sabendo que ficará sempre aquém do que realmente há na antiga Villa de San Cristóbal de la Habana e que me faz guardá-la num lugar especial no meu coração. Primeiro, em Havana há Havana. Esta é a parte que nem me atrevo a justificar. Começo mal, eu sei. Para quem me continua a ler, depois de tão esfarrapada explicação inicial, direi que há mais coisas. Em Havana, cidade natal de Jose Martí, há cubanos, um povo culto e pobre, que um regime opressor de décadas não abafou a alegria e a genuína satisfação de conviver. Em Havana pairam histórias indecifráveis entre as paredes do Hotel Sevilha, do Nacional e do Ambos Mundos, segredadas por Hemingway, Graham Greene, Al Capone, Josephine Baker, ou Guevara. Em Havana há uma maresia que nos salpica o rosto no Malecón quando o sol se põe e o azul do céu dá lugar a uma cor vermelha alaranjada só existente no caleidoscópio de cores que essa velha marginal coloca sob os nossos olhos, enquanto nos deliciamos com um puro da Fábrica Partagas. Em Havana vive-se uma atmosfera única entre os daiquiris bebidos na Bodeguita del Medio e as noites perdidas em danças intermináveis nos braços de bailarinas exímias e vibrantes, até que a alvorada nos sussurre que a cidade que não dormiu, acordou, ao som do Mambo, da Salsa, da Rumba, do Merengue ou da Pachanga. Havana é histórica e monumental, envelhecida e jovem, nostálgica e arrebatadora, barroca e neo-clássica. Havana é pura e ingénua, senhora respeitável e mulher atrevida e provocadora no alto das varandas dos edifícios, ou ao abrigo das arcadas e dos páteos, onde o pecado inconfessado se adivinha. Havana é cor, é ritmo, é despudorada e inocente. Em Havana somos seduzidos pelo encanto dos extremos que se passeiam de mãos dadas, unidos pela personalidade e pelo carácter de quem não cedeu, ou se entregou. Só nós, que a vivemos, não conseguimos resistir e cedemos à sua magia, e nos entregamos a uma cidade que nos marca para sempre. Acho que isto é um pedaço, apenas um pedaço do que há em Havana.

16 comentários:

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

deve ser autentica magia,sim!

Mike disse...

Indescritível, eu diria, Júlia.
:-)

Luísa A. disse...

Meu caro Mike, gostei imenso de o ler. Não porque tenha ficado a conhecer melhor Havana, ou sequer com mais curiosidade em conhecer, mas porque fiquei a saber imenso de si! ;-D
É uma descrição expressivíssima dos seus próprios gostos, da sua sensibilidade e, até, do seu temperamento, que se reviu num real ou imaginado inconformismo cubano. Mas – justiça lhe faço - também me transmite a ideia de que o ambiente em Havana é, ao nível da rua, simultaneamente exótico, familiar, pouco intimidativo, quase cúmplice e, nessa medida, muito sedutor. ;-)

Leonor disse...

Belíssimo, Mike, e muito obrigada pelos elogios.
Beijinho

ana v. disse...

Belíssima prosa, Mike, quase um poema a Havana. Gostei imenso de lê-lo. Parece que andamos ambos com alguma nostalgia de viagens exóticas...

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

ele levou-nos para Haana, Ana

LOL

Anónimo disse...

Ó diabo... eu que nem sou pessoa de falar demais, parece que escrevi demais. (risos)
Obrigado, Luísa. :D

Obrigado, Leonor.
Outro para si. :-)

Agradeço, Ana.
Não sei se é nostalgia, Ana. Até porque quando o assunto é viagens exóticas, este moço está sempre pronto para preparar a trouxa. A culpa foi da Leonor... ;-)

Anónimo disse...

(lol)
Júlia, :D

Leonor disse...

Ainda a minha Havana, Mike

A Leonor está sempre para as curvas no que toca a viagens ;-)

Anónimo disse...

Mas a sua Havana é deliciosa, Leonor. :D

Paulo Cunha Porto disse...

Evocação muito digna da que foi chamada a Monte Carlo das Caraíbas. Obrigadíssimo, Meu Caro Mike.
Abraço

Anónimo disse...

Eu é que Te devo agradecer pelo comentário, meu Caro.
Um abraço.

ana v. disse...

Mas é por isso mesmo que eu falo de nostalgia do exótico (sem a conotação de "tristeza" da palavra nostalgia)... eu também estou sempre de malas prontas para esse tipo de viagem. Bem... em boa verdade, para qualquer tipo de viagem! lol

Anónimo disse...

Ai esta menina que está sempre pronta para partir... não é menina Ana? (risos)
Eu também. O problema (ou não) é que a vontade de voltar não é proporcional e acho que aí para esses lados os bilhetes são sempre de ida e volta, certo? :-)

Corine disse...

uma belíssima atura para ir agora, no fim-de-ano, comemorar os 50 anos da revolução. sentir o espírito contagiante do povo cubano.

Anónimo disse...

Olha, não me tinha lembrado disso, Corine. Acho que da próxima vez que lá voltar, para além de Havana, irei para outras paragens (menos a Varadero). :-)

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