Fernando Pessoa
28.6.08
Fernando Pessoa não era sábio. Ou seria?
Ter opiniões definidas e certas, instintos, paixões e carácter fixo e conhecido - tudo isto monta ao horror de tornar a nossa alma um facto, de a materializar e tornar exterior. Viver num doce e fluido estado de desconhecimento das coisas e de si próprio é o único modo de vida que a um sábio convém e aquece.
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15 comentários:
Com a extrema lucidez que ele tinha (e neste texto isso está bem patente), esta definição de sabedoria só pode querer dizer a libertação desse sofrimento - o de ser lúcido. Era sábio, sim, tão sábio que ironizava com a sua própria condição. E nunca se deixou "aquecer" pelo desconhecimento das coisas, por muito que achasse que isso lhe convinha.
Good point, Mike. A lucidez tem sempre um preço, não é?
Concordo inteiramente com a Ana. Com todas as limitações que tenho, Fernando Pessoa sempre me pareceu alguém que, mais do que a viver (num doce e fluido estado de desconhecimento), se entreteve a ver-se viver e a aprofundar os mecanismos de todos os estados interiores (seus e alheios), quer os doces e fluidos, quer os menos doces e menos fluidos. Dessa frase, um pouco amarga, poderá deduzir-se que a sabedoria está na felicidade de não se saber coisa nenhuma, que ele não foi sábio ao querer saber alguma coisa… e, enfim, que eu sou sábia, porque – por força deste calor horrível que faz – já aderi ao tal doce e fluido estado dos que não pensam. :-)
P.S.: Voltemos à temática linear dos frangos, portanto… ;-D
O desinvestimento como consequência do Saber, Caro Mike, fez-me lembrar Schopenhauer sobre o Matrimónio - "Só um filósofo poderia ser feliz no casamento. E os filósofos não casam".
Abraço
Era um dos que dizia "sei que não vou por aí", com a segurança dessa lucidez de que falam...
Pois é, Ana, a lucidez, como quase tudo na vida, tem um preço. É uma das coisas que nos diz Pessoa, nesta breve reflexão.
Luísa, mas aderir ao estado dos que não pensam à conta da canícula, é sintoma de sapiência. :)
E com este calor a temática dos frangos não é a mais aconselhável. Há que os virar, mas para onde? para que lado os virei da última vez? bolas, foi para a esquerda? ou terá sido para a direita?... obriga a pensar... (risos)
Ah mas isso é uma injustiça para com a condição humana, Caro Réprobo. ;)
E saber que não se vai por aí, Cristina, já não é nada mau. ;)
Ah, frangos hoje não; só nadar em águas refrescantes...
(nem Pessoa, que amo, diria melhor...)
(risos)
:-p
e o que é o alheamento senão consequência de quem sabe "toda a verdade", sinónimo de uma grande lucidez?
Pessoa foi sábio, sim, Mike, porque entendeu tudo de todas as maneiras, sobretudo porque se desdobrou a ele próprio,"qual cadáver adiado que procria" para que nós, seus leitores, nos pudessemos conhecer um pouco melhor a nós próprios, como bem disse Saramago.
E perante comentário de tão grande admiradora e conhecedora de Fernando Pessoa, me curvo com uma vénia, Júlia. :)
Tal como a Júlia Moura Loes referiu aqui, Fernando Pessoa ajudou-me a mim, sua devota leitora, a pensar e a pensar-me. Mais que um sábio foi um génio. Ainda na adolescência adoptei dele uma reflexão que me encanta: "Sou, entre mim e mim, o intervalo". E é isso exactamente que somos. Se pensarmos bem...
E não precisamos pensar muito, Teresa. É exactamente isso que somos. Adoptar essa reflexão na adolescência é que tem que se lhe diga... :)
Há poemas e heterónimos de Pessoa para todos os estados de espirito e para todas as idades.
Nos meus vinte anos, Campos bastava-me, agora, quando necessito de certezas (cada vez as tenho menos) socorro-me de Reis, tão certinho, tão cheio de razão que até mete nervos :-)
Quando me quero disciplinar, leio Teive, o estóico.
Quando quero sonhar, leio O Privilégio dos Caminhos, alto , para que os meus sonhos se tornem realidade.
Quando quero chorar de raiva, leio a Ode à Noite (fragmentos) de Campos; quando quero pensar em tudo, leio a Ode Marititima, tem lá tudo.
E busco consolo no potencial suicida que foi Soares, o mutilado de alma.
e por aí fora...
Conhecedora não sou, Mike, pois da experiência que tenho, tratando-se de Pessoa, ninguém o é...
Em tempos fui declamadora intensiva de Pessoa, carinho de José Augusto Seabra, meu admirador. Era muito nova para ter dado valor à experi~encia riquissima que vivi no contacto com ele. Já agora vos digo que foi ele quem me ofereceu o livrinho O Privilégio dos Caminhos, era eu uma ganapa.
Bons hábitos e boas rotinas, Júlia. :) Acho que vou escrever sobre isso...
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