11.6.08

O que os portugueses precisavam há trinta anos.

Um dos mais recentes Pensamentos do dia do Helder Robalo, e acredito ter a sua autorização para o mencionar sem lha ter solicitado previamente, trouxe a esta minha memória cansada, uma conversa tida com a minha mãe há mais de trinta de anos. Víviamos os três na Nazaré – o terceiro é o meu irmão mais novo – já que o meu pai resolvera voltar para Angola, recusando-se a participar no obsessivo carpir mágoas de alguns Retonados, ou a aceitar o que considerava uma esmola indigna do ex-IARN, para quem tinha dedicado toda uma vida de trabalho naquela ex-colónia. Voltou e permaneceu durante longos anos, arriscando a vida em alguns momentos e tornando-se emigrante num país que considerava também dele. Mas isso são contas de outro rosário que, eventualmente, darão palavras escritas noutro post. Voltemos à tal conversa que eu tive com a senhora que me deu à luz e criou, e por quem tenho uma profunda admiração. Numa das muitas cartas trocadas entre marido e mulher, que ela se incubia de partilhar os trechos que julgava apropriados e que poderiam contribuir para a nossa formação, o meu pai dizia-se entristecido com a pobreza do país e do povo português. Em resposta, a senhora minha mãe comentou, serena e sem manifestar a azia que a contaminava naquele período histórico que se viva e pelos tempos difíceis que a sua família atravessava, que o verdadeiro problema do povo português não se circunscrevia ao dinheiro ou a outros aspectos materiais. Do que o povo português precisava era de educação e cultura, disse ela ao marido na carta que lhe enviou. Passados trinta anos, e depois de ler o post do Helder*, não consegui evitar questionar-me. Precisava? ou precisa?

*Obrigado, Helder.

10 comentários:

O Réprobo disse...

Meu Caro Mike,
o problema é que a Educação não resolve o problema anímico. Ninguém fez mais por ela do que o Estado Novo: quando Salazar chegou ao Poder, havia 80% de anlfabetos, quando o largou, 20% e, entretanto, a população duplicou. Veio a Revolução, disseram que ler escrever e contar nada valiam, passaram para as pedagogias não-directivas, desataram a meter conceitos adjectivos de estruturalismos &Cº nas mentes dos primeiros anos do Secundário, continuando a mudar os nomes. Por fim, o Eng. Guterres apaixonou-se. E continuamos a carpir o que se carpia no fim do Século XIX, o filistaísmo da classe política, o fariseísmo dos intelectuais, as vistas curtas do Povo.
Não será um fado, mas vai senndo uma ladaínha.,
Abraço

Anónimo disse...

Meu Caro Réprobo, com essa pontaria, um dia convido-o para ir à caça às perdizes. É que agora mencionou duas palavras e no conteúdo a que elas se pode atribuir, de que também não sou grande apreciador. Fado e ladaínhas.
Um abraço.

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

texto saboroso, Mike!..fico até com "inveja boa", gostava de o ter escrito.

Entretanto, do que os portugueses precisam AINDA é de educação e cultura...não basta saber ler e escrever...

beijinhos

Anónimo disse...

Ora, Júlia (sorriso embaraçado)... agradeço o seu comentário. :)

ana v. disse...

Por muito que me interesse por textos blogosféricos de informação e análise, por notícias comentadas, por actualidades coadas pelo crivo de um bom cronista, de preferência com sentido de humor, acabo sempre por chegar à conclusão de que são estes textos confessionais/pessoais os que mais me comovem e ensinam. Quando são bem escritos, claro, mas sobretudo quando são autênticos e despretensiosos. Como este seu, Mike, que me marca pelo relato sincero de uma experiência de vida que não deve ter sido fácil mas que foi, com certeza, muito rica. Parabéns.

Luísa A. disse...

O problema também tem a ver com o provérbio chinês do seu anterior «post», Mike. A gestão portuguesa, seja ela de empresas, seja de ministérios, rege-se pelo modelo vigente na construção civil e no futebol, em que os resultados têm de se obter numa «temporada». E a Educação não foge à regra: as reformas mudam de cada vez que muda o ministro, porque as anteriores «provaram», nos dois ou três anos da anterior «regência», que não prestavam. E a aposta «If you’re planning for one hundred years, grow people», esse investimento de longo prazo nunca é feito, porque a miopia geral não permite ver para além do imediatismo imposto pelas guerrinhas partidárias. É pena. Se houvesse mais seriedade, mais continuidade e mais perseverança, acredito que pudéssemos ter, dentro de cinquenta anos (os que levamos de atraso), o mesmo nível de brio, civismo e produtividade (?!) que os países europeus mais evoluídos têm hoje. Porque nós – aí discordo do Réprobo – até aprendemos. Temos um cérebro um pouco chocho, mas muito maleável e particularmente receptivo a boas «lavagens». Aliás, a questão do nosso futuro carácter nacional resume-se, para mim, em saber quem vai «lavar» melhor nas próximas décadas: se a Educação,… se a televisão.

P.S.: Mike, alonguei-me bastante, mas a intenção era, neste comentário, fazer «dois em um» e abranger também o seu «post» anterior, cujo tema é afim. E, já agora, se notar raciocínios mal alinhavados, leve-os à conta do sono que, às duas horas e dezoito minutos desta quente madrugada, se abateu, bruscamente, sobre a minha pessoa. :-)

Helder Robalo disse...

Meu caro, o grande problema dos nossos governos, e país, é que se fala mais do que se faz e vão-se mudando as políticas ao sabor dos governos e dos ministros. Há políticas educativas a três ou quatro anos e não dez ou 15 anos. E, por isso, continuamos no "rame-rame" do costume, com o choradinho do costume.

E, claro, não precisava de autorização para me citar. Era só o que faltava ;);)

Um grande abraço. E um grande texto!

Anónimo disse...

Ana, obrigado (assim fico ainda mais embaraçado, acredite). Não lhe sei dizer se a minha experiência vida foi fácil ou difícil. Isso, aprendi com ela, é tão relativo, priciplamente para mim que fui habituado e educado a "olhar para o lado". E "ao lado" há sempre melhor e pior. Que tem sido rica, confesso que acho que sim, e o que conta aqui é o que eu sinto e acho. :)

Anónimo disse...

Luísa, que insónia... (risos)
Pela parte que me toca, e sendo muito egoísta da minha parte, direi que feliz insónia essa. :)
A Luísa nunca se alonga (e estou a ser sincero) e quando o faz, fá-lo sempre bem, ou seja, só a senhora é que fica com a sensação que se alongou. :)

Anónimo disse...

Helder, um duplo obrigado. :)
E um abraço.

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