22.7.08
Não consigo sentir solidariedade.
Li o post no Corta-Fitas e não comentei. Achei que não devia fazê-lo a quente, que devia amadurecer a minha primeira reacção ao facto da Eunice Muñoz ter sido dispensada a pouco tempo da reforma do Teatro Nacional D. Maria II, onde era actriz residente há mais de vinte anos. Não li a notícia no Expresso a que o post fazia referência e onde a actriz confessa que se soubesse o que sabe hoje, teria optado pela nacionalidade espanhola, dada a sua descendência. Bastou-me ler o post para adivinhar o tom amargo e o sabor a fel da entrevista. Adivinho, também, um certo arrependimento (palavra de que não gosto, mas isso fica para outra altura) da actriz relativamente à questão da opção pela nacionalidade espanhola. O meu sentimento inicial ao ler o post não mudou, tornou-se antes mais sólido e lúcido depois de amadurecido. O que esperava Eunice Muñoz? Reconhecimento? Não o teve do público durante grande parte dos setenta anos de carreira? Não o meu, mas isso é uma questão pessoal. Eunice Muñoz terá a reforma que lhe é devida, sem o respectivo complemento, a mesma que muitas vezes é subtraída a inúmeros trabalhadores anónimos. Não consigo ser solidário com a dor da actriz. E não creio tratar-se de ingratidão. Eunice Muñoz entregou-se à profissão que escolheu e como boa profissional, entregou-se de corpo e alma. Recebeu em troca o que devia ter recebido. Do público e do Estado. Não deveria esperar mais em troca. Identifico-me com Fernando Pessoa quando ele diz que o seu passado é tudo quanto ele não conseguiu ser e nem as sensações dos momentos idos lhe são saudosas, sendo o passado um virar de página. Não consigo ser solidário, nem achar que esteja em presença de um caso em que a cultura possa estar a ser lesada. Acreditando no seu arrependimento àcerca de poder ter optado por ser espanhola, só me resta dizer, sinceramente, que tenho pena que o não tenha feito em tempo útil. E perguntar-me, sem que esteja à espera de resposta, porque não o fez. No melhor pano cai a nódoa, e neste caso, foi no melhor palco. Se fosse um admirador de Eunice Muñoz, sentir-me-ia decepcionado. Não é o caso, com o devido respeito pela profissional. Felizmente, que assim é uma decepção a menos.
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24 comentários:
Engraçado, Mike... penso exactamente o contrário, tanto a quente (quando comentei no Corta-Fitas) como a frio, agora que já reflecti sobre o assunto. E digo "engraçado" porque também eu não sou especial admiradora de Eunice Muñoz nem de Ruy de Carvalho, que está na mesma situação neste caso. Mas acho que eles são os actores mais veteranos que temos, e que o país lhes deve respeito por isso. Respeito, reconhecimento e admiração, já que se dedicaram de corpo e alma, uma vida inteira, a uma profissão que não pode ser mais ingrata e mal paga. Uma profissão que nos enriquece, que faz parte da nossa identidade e do nosso património cultural. Só desde que existem as novelas portuguesas (há meia dúzia de anos) é que os actores de teatro recebem um ordenado decente ao fim do mês. Por isso o que fizeram com estes dois actores, a pouco tempo da reforma, é uma falta de consideração por eles. Ainda mais porque todos sabemos que isto é uma espécie de retaliação política, por parte de um partido que está no poder e não teve o apoio eleitoral de nenhum dos dois... e é isso que é o mais triste.
Desculpe o discurso, já sabe que eu também não sou de me calar...
...a minha posição é exactamente a da Ana. Também não sou grande admiradora dela, mas acho que não tiveram consideração por eles,tão pouco humanidade, o mais que não fosse para que não os prejudicassem, deveriam ter adiado, não se faz. Entendo o desabafo de Eunice, deverá estar revoltada.
Ana e Júlia, respeito a vossa opinião, apesar de diferente da minha. Peço que me desculpem o facto de responder a ambas em simultâneo. Este caso, com as devidas diferenças e proporções, trouxe-me à memória o exemplo que os ingleses deram nas primeiras eleições depois da 2ª Grande Guerra, onde uma nação tanto deveu a Churchill. Votaram nos socialistas liderados por Clement Atlee, porque uma página da História tinha sido virada.
Num País onde um deputadozeco, que se limita a fazer figura de presença, tem tantas regalias ao fim de oito anos?
Esse país tem um problema, sem dúvida. Mas esse é outro problema, Cristina. Diferente deste sobre o qual emiti a minha opinião.
Meus amigos, como não li a notícia, poderiam dizer-me de quanto falamos, quando falamos de reforma e de complemento de reforma?
E, já agora, que vínculo é que ela tinha, quando se fala de "dispensada"?
Ah, isso não sei. Sou me debrucei sobre o princípio.
a Fugi tem razão, ela deveria ter um contrato...
Mike, quando encerrrei uma pequena firma que tive,dois funcionários ainda não tinham atingido o tempo necessário para usufruir do subsidio de desemprego. Como os fui buscar ao desemprego, senti-me na obrigação moral de continuar a descontar durante os meses que faltavam, por humanidade, uma vez que fechei abruptamente.
Assim eles deveriam ter feito, para não prejudicar ninguém.
Júlia, gesto louvável o seu, próprio de uma pessoa de bem. Contudo, esses funcionários não deviam esperar mais do que tinham direito. Acho que me entende, apesar de poder parecer-lhe rude. O que avaliei neste post foi a perspectiva e a desilusão da funcionária, não a humanidade ou a falta dela, e de não reconhecimento da entidade patronal. Continuo a achar que a Eunice Muñoz não devia esperar mais do que já teve ou deveria ter. E o desabafo da nacionalidade é, a meu ver, totalmente desprepositado. Até pelo respeito que lhe devia merecer o seu público, os portugueses.
Mike, o desabafo da nacionalidade é, concordo, despropositado.
Mas não consigo opinar quanto ao mais, nem sequer por uma questão de princípio, quando não percebo o conteúdo do "dispensar"...
Já andei no google à procura da notícia mas só aparece o seu blog (risos) e o do corta-fitas...
:-)))
acho, Mike, qque as empresas têm responsabilidade civil para com os empregados. Encerrar assim, nem que seja uma chafarica, não tendo em conta a vida das pessoas, que tinham sonhos e planos, não está certo...
Até aí estamos 100% de acordo Júlia. Mas é o caso? Ou "estamos" a ter uma reacção emocional e a dramatizar o assunto Eunice Muñoz?
Também me pergunto o que signifca estar "quase na reforma" no caso de Eunice Muñoz e Ruy de Carvalho, que têm ambos oitenta anos...
eu acho que é o caso,Mike, com o acréscimo de que eles prestaram um serviço público, a Arte é serviço de interesse público.
entendo a amargura dela, com sabor a ingratidão, falta de reconhecimento pela antiguidade.
quando estamos ressentidos, somos exagerados, ela é do meu signo, Leão. Somos assim ;-)
beijo
Também a entendo perfeitamente, é um desabafo mais do que justificado. Ninguém é de ferro.
Este país tem por hábito tratar mal os seus artistas, o que é lamentável. E só lhes dá algum valor quando os estrangeiros os reconhecem primeiro. Há muitos actores que estão na miséria, literalmente, depois de terem passado uma vida inteira a divertir ou a comover o público. É muito injusto, se compararmos com o que se passa com os políticos e as suas carreiras meteóricas, como diz a Cristina... :(
toc, toc, toc...
(ela bate à porta)
Ó da casa...?
(torna-se afoita...)
Então, quando é que recomeça a desconversa, hein?
Novo post, vá lá... please :-)
estamos á espera, Gaita!!
Aviso
Anúncia-se que o dono do pedaço tem pouco mais de meia-hora para postar... sob pena de se apresentar a competente queixa nas diversas autoridades competentes para o efeito e, ainda, se intentar acção de indemnização cível por evidentes danos morais!
(riso contido, olhar verde fulminante...)
Não podia estar mais de acordo.
até podia acrescentar mais algumas coisinhas relativas ao seu comportamento para com o Teatro Nacional D. Maria nestes últimos anos de carreira mas, creio que, o seu texto é mais que suficiente.
Aleluia!
Alguém concorda comigo, Corine. :)
não tem que agradecer.
talvez esse devesse ser um comportamento padrão a aplicar noutras questão, algumas até aqui apontadas mas, como disse, essas são outras questões. Não é disso que aqui se fala.
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